No templo valdense de Turim Francisco pediu perdão pelos comportamentos não cristãos



A unidade faz-se a caminho

 

Na manhã de segunda-feira 22, o Papa Francisco visitou o templo valdense de Turim situado na avenida «Vittorio Emanuele». Eis o texto do discurso pronunciado durante o encontro ecumênico. Queridos irmãos e irmãs É com grande alegria que hoje me encontro entre vós. Saúdo-vos a todos com as palavras do apóstolo Paulo: «A vós, que sois de Deus pai e do Senhor Jesus Cristo, paz e graça vos sejam dadas» (1 Ts 1, 1 — Tradução interconfessional em língua corrente). Saúdo em particular o Moderador da Mesa Valdense, Reverendo Pastor Eugenio Bernardini, e o Pastor desta comunidade de Turim, Reverendo Paolo Ribet, aos quais dirijo o meu sincero agradecimento pelo convite que tão gentilmente me fizeram. O cordial acolhimento que hoje me reservais faz-me pensar nos encontros com os amigos da Igreja Evangélica Valdense do Rio da Prata, dos quais pude apreciar a espiritualidade e a fé, e aprender muitas coisas boas. Um dos principais frutos que o movimento ecumênico já permitiu que se recolhesse ao longo destes anos foi a redescoberta da fraternidade que une todos os que acreditam em Jesus Cristo e foram batizados em seu nome. Este vínculo não se baseia em critérios simplesmente humanos, mas na partilha radical da experiência fundante da vida cristã: o encontro com o amor de Deus que se nos revela em Jesus Cristo e a ação transformadora do Espírito Santo que nos assiste no caminho da vida. A redescoberta desta fraternidade permite-nos compreender o laço profundo que já nos une, não obstante as diferenças. Trata-se de uma comunhão que ainda está a caminho — e a unidade constrói-se no caminho — uma comunhão que, com a oração, com a constante conversão pessoal e comunitária e com a ajuda dos teólogos, nós esperamos, confiantes na ação do Espírito Santo, que se possa tornar comunhão plena e visível na verdade e na caridade. A unidade que é fruto do Espírito Santo não significa uniformidade. Com efeito, os irmãos estão acomunados por uma mesma origem, mas não são idênticos entre eles. Isto está bem claro no Novo Testamento, onde, apesar de serem chamados irmãos todos os que compartilhavam a mesma fé em Jesus Cristo, é possível intuir que nem todas as comunidades cristãs, às quais pertenciam, tinham o mesmo estilo, nem uma idêntica organização interna. Até dentro da mesma pequena comunidade era possível distinguir diversos carismas (cf. 1 Cor 12-14) e no anúncio do Evangelho havia diversidades e, por vezes, contrastes (cf. Ac t 15, 36-40). Infelizmente, aconteceu e continua a acontecer que os irmãos não aceitem a sua diversidade e acabem por fazer guerra um contra o outro. Refletindo sobre a história das nossas relações, não podemos deixar de nos entristecer perante as contendas e as violências perpetradas em nome da própria fé, e peço ao Senhor que nos dê a graça de nos reconhecermos todos pecadores e de nos sabermos perdoar uns aos outros. É por iniciativa de Deus, o qual nunca se resigna diante do pecado do homem, que se abrem novos caminhos para viver a nossa fraternidade, e não podemos subtrair–nos a isto. Da parte da Igreja Católica, peço-vos perdão. Peço-vos perdão pelas atitudes e pelos comportamentos não cristãos, por vezes até desumanos que, na história, tivemos contra vós. Em nome do Senhor Jesus Cristo, perdoai-nos! Portanto, estamos profundamente gratos ao Senhor ao constatar que as relações entre católicos e valdenses hoje estão cada vez mais fundadas no respeito recíproco e na caridade fraterna. Não foram poucas as ocasiões que contribuíram para tornar mais firmes estas relações. Penso citandos só alguns exemplos — também o reverendo Bernardini já o fez — na colaboração para a publicação em italiano de uma tradução interconfessional da Bíblia, nos acordos pastorais para a celebração do matrimônio e, mais recentemente, na redação de um apelo conjunto contra a violência contra as mulheres. Entre os muitos contactos cordiais em diversos contextos locais, onde se compartilham a oração e o estudo das Escrituras, gostaria de recordar o intercâmbio ecumênico de dons realizado, por ocasião da Páscoa, em Pinerolo, pela Igreja valdense de Pinerolo e pela Diocese. A Igreja valdense ofereceu aos católicos o vinho para a celebração da Véspera de Páscoa e a Diocese católica doou aos irmãos valdenses o pão para a Santa Ceia do Domingo de Páscoa. Trata se de um gesto entre as duas Igrejas que vai muito além da simples cortesia e que faz antegozar, de certa forma  aquela unidade da Mesa eucarística pela qual ansiamos. Encorajados por estes passos, somos chamados a continuar a caminhar juntos. A evangelização é um dos âmbitos nos quais se abrem amplas oportunidades de colaboração entre valdenses e católicos. Conscientes de que o Senhor nos precedeu e sempre nos precede no amor (1 Jo 4, 10), vamos juntos ao encontro dos homens e das mulheres de hoje, que por vezes parecem tão distraídos e indiferentes, para lhes transmitir o âmago do Evangelho, ou seja, «a beleza do amor salvífico de Deus manifestado em Jesus Cristo morto e ressuscitado» (Exort. apost. Evagelii gaudium, 23). Outro âmbito no qual podemos trabalhar cada vez mais unidos é o serviço à humanidade que sofre aos pobres, aos doentes, aos migrantes. Agradeço lhe pelo que disse sobre os migrantes. Da obra libertadora da graça em cada um de nós deriva a exigência de testemunhar o rosto misericordioso de Deus que cuida de todos e, em particular, de quem se encontra em estado de necessidade. A escolha dos pobres, dos últimos, de quantos estão excluídos da sociedade, aproxima-nos do próprio coração de Deus, que se fez pobre para nos enriquecer com a sua pobreza (cf. 2 Cor 8, 9) e, por conseguinte, aproxima-nos mais uns dos outros. As diferenças sobre importantes questões antropológicas e éticas, que continuam a existir entre católicos e valdenses, não impedem que possamos encontrar formas de colaboração nestes e noutros âmbitos. Se caminharmos juntos, o Senhor ajudar-nos a viver aquela comunhão que precede todos os contrastes. Queridos irmãos e irmãs, agradeço-vos novamente este encontro, que gostaria nos confirmasse num modo novo de estarmos uns com os outros: olhando sobre tudo para a grandeza da nossa fé comum e da nossa vida em Cristo e no Espírito Santo, e só depois, para as divergências que ainda subsistem. Garanto-vos a minha recordação na oração e peço-vos, por favor, que rezeis por mim: preciso disso. O Senhor conceda a todos nós a sua misericórdia e a sua paz.

 

 

Fonte: L’OSSERVATORE ROMANO – Ano XLVI- número 26 (2.369)- página 8, quinta-feira 25 de Junho de 2015,

 

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